Por uma Museologia do Trabalho

Por uma Museologia do Trabalho - Tiago Tavares e Silva

Há muito está consolidada uma Sociologia do Trabalho, assim como uma Museologia Social. Sem dúvida elas têm seus espaços e temáticas bem definidas, mas não seria o caso de pensar em uma área que dialogue com elas, mas que também tenha sua autonomia? Da mesma forma que a Sociologia pode envolver o trabalho sem impedir que isso tenha evitado o surgimento da Sociologia do Trabalho, ou que a Museologia envolva necessariamente o social, mas que tal fator também não evitou a emergência de uma museologia social, até para demarcar, em sentido amplo, um posicionamento político e teórico críticos, também não seria o caso de pensar uma museologia que tivesse especificidades enquanto voltada ao trabalho?

Uma museologia do trabalho não teria essa nomenclatura apenas por ter como temas de exposições o mundo do trabalho, isso é o ponto de entrada (ou de saída, como veremos). Uma possível museologia do trabalho adere ao nome como forma de (re)afirmar a centralidade do trabalho na nossa organização social e/ou como forma de destacar sua importância. A Museologia do Trabalho tem como requisito um posicionamento político, tal como a Museologia Social, mas com suas particularidades. 

Partimos então, provisoriamente, de alguns pressupostos: assim como consolidado na Museologia Social, a Museologia do Trabalho não admite a possibilidade de uma museologia neutra, pois sempre estará, em maior ou menor grau, comprometida com a valorização ou precarização do trabalho, de modo explícito ou não; o trabalho é a centralidade da vida social, pois mulheres e homens vivem com/na materialidade e nela funda uma vida social e cultural a esta materialidade indelevelmente ligada; esta museologia entende que o trabalho ou a perspectiva do trabalho é uma possibilidade perene e sólida para realização de exposições; por fim, a Museologia do Trabalho considera que toda ação e objeto museais têm vinculação com o trabalho.

As considerações elencadas estariam conexas em uma prática e teoria da Museologia do Trabalho. O trabalho (ação de modificação da natureza por meio de externalização da humanidade, uma ação humana orientada a um fim) é que, em um dado período histórico, produziu, por exemplo, uma machadinha de pedra de dezenas de milhares de anos atrás que está em um museu qualquer. Ela foi produzida por trabalho humano, mais especificamente para sobreviver. Muito tempo depois, foi recolhida pelo trabalho de algum arqueólogo. Logo em seguida, a machadinha foi higienizada, catalogada e acondicionada por um museólogo. Como parte de uma exposição, foi associada a outras peças dentro de um dado discurso elaborado pelo trabalho do curador. E a exposição, dentro dessa perspectiva, pode pensar a importância do trabalho na evolução da espécie humana. 

Esse arranjo teórico-prático tem necessariamente um posicionamento político (em sentido lato), pois remove o biombo do trabalho dentro de um campo tão fetichizado por idealismos puramente abstracionistas. Talvez o maior resquício da museologia tradicional seja justamente o de permanecer sem a incorporação da reflexão do trabalho para a comunicação museal, ou seja, mesmo sendo comunitário, dialógico e não centrado no objeto, muitos museus contemporâneos ainda tem o trabalho como elemento ofuscado pelo discurso expositivo e objetos da coleção. 

Cabe, por último, reiterar que não se trata de uma eventual exposição cujo tema seja o trabalho (ou reivindicação para que isso ocorra mais vezes). Trata-se de uma área em que o trabalho apareça, ao fim e ao cabo, triplamente: tema, reflexão do próprio fazer museal e posicionamento crítico. Uma museologia sem a devida consideração do trabalho – o que justamente a torna possível – é uma museologia alienada dos homens e mulheres, pois apartada das mãos e mentes que a fazem.

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