Ruralidade e o Sagrado: O agricultor no mês de Santana

Desde sua fundação, na década de 1960, o Museu do Seridó pesquisa, preserva e
comunica aspectos da devoção católica na região, em especial em Caicó. Antes como uma
manifestação oficial da própria Igreja, através da Diocese de Caicó, a qual pertencia o Museu.
Depois, por investigação científica, enquanto museu universitário, abriu para outras devoções
que não a católica oficial. Esse longo histórico de estudos entre aspectos devocionais,
museologia e história estimula nossa pesquisa a procurar outros vieses ainda não abordados
pelo Museu acerca do fenômeno sociocultural da religiosidade na região. Um exemplo disso
é a relação entre agricultores e a Festa de Santana.

Os museus contribuem na segurança e preservação dos acervos que indiretamente e
diretamente os ajudam a contar histórias dentro de seus cortes temáticos. Mas a preservação
ocorre juntamente com bens imateriais, quando pesquisamos e comunicamos modos de fazer,
no caso, o dos sertanejos agricultores na festa de Santana. Nessa perspectiva, o MDS/UFRN
tenta contribuir para a história local e regional. Seu benefício para sociedade se torna
relevante ao dar visibilidade àqueles que tornam nossa alimentação possível. Mais que isso,
desvela processos culturais relacionados ao trabalho do agricultor seridoense, ou seja, não se
trata apenas de dizer que esses trabalhadores existem e merecessem ser lembrados, mas
também de que há elementos além dos mais aparentes (plantar e colher).

Neste breve apontamento, o qual pretendemos desenvolver, focamos na relação entre
religiosidade e trabalho no campo, especificamente durante o mês de Santana, que é julho, na
cidade de Caicó, município do Rio Grande do Norte. Desse modo, a fé muitas vezes
desempenha um papel fundamental na vida de um agricultor. A agricultura é uma atividade
que está fortemente ligada às forças da natureza e aos elementos do clima, e muitas vezes está
além do controle humano. Assim, os agricultores muitas vezes recorrem à fé para encontrar
conforto e orientação durante os desafios enfrentados em seu trabalho. Nessa perspectiva,
continuando no mês de Sant’Ana, a história narrada é que o vaqueiro pediu a Sant’Ana para o
poço nunca secar. A promessa foi atendida e, posteriormente, uma igreja foi construída pelo
vaqueiro como uma forma de gratidão por ela ter “ouvido” o seu pedido. Essa narrativa
popular traz um pouco do imaginário regional. Foi primordial para o povo seridoense ter uma
devoção à Sant’Ana, pois esse “milagre” foi responsável para ela ter sido escolhida como
padroeira de Caicó.

A relação de crença no milagre, entre o agricultor e o cumprimento de promessas,
pode ser vista de diferentes maneiras, dependendo do contexto e das situações específicas
envolvidas (a partir da antropologia enquanto pesquisa da mentalidade devocional, da estética
artística na casa do devoto com imagens, da história da agricultura regional, da geografia
enquanto produção de lugares e espaços dotados de uma economia física e simbólica etc).
Perante esses aspectos, o mês de julho é marcante para o agricultor caicoense, que algumas
vezes precisa trabalhar em outras terras, quando é justificada a imagem do filho que vai embora de Caicó, mas sempre retorna para seu lar nessa data, para agradecer a Sant’Ana
pelas bênçãos conquistadas.

Autoria do texto: Uemerson Jardel da Silva e Tiago Tavares e Silva

Autoria da arte: José Lucas de Araújo

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