Arte e comida: O livro de receitas do Toulouse-Lautrec

Livro de receitas “The Art of Cuisine”. Imagem: Amazon

Arte e comida possuem uma relação estreita quando o assunto é história da arte, principalmente ao levar em conta os aspectos visuais dos alimentos, as representações simbólicas e os valores culturais e sociais. Segundo o filósofo Michel Onfray, a questão gastronômica é estética e filosófica: as práticas culturais das civilizações de todas as épocas e as belas-artes relacionam-se com a cozinha, que em seus diversos períodos históricos as representa tanto quanto as pinturas, as sonatas, as esculturas, as peças de teatro ou a arquitetura.

Durante o Impressionismo, os artistas franceses retrataram os passatempos do mundo moderno, e alguns deles se concentraram em torno da comida e da bebida, como nas representações de refeições em restaurantes, piqueniques e até mesmo nos entretenimentos noturnos de bares e cabarés. Ao final do séc. XIX, Paris ostentava mais de 27.000 cafés e mais estabelecimentos de bebidas do que qualquer outra cidade do mundo.

No Pós-Impressionismo, Maurice Joyant, amigo do artista Henri de Toulouse-Lautrec, escreveu o livro de receitas “The Art of Cuisine” (1966). As páginas contêm desenhos do artista, uma pintura de Edouard Vuillard retratando Lautrec na frente de seu forno, histórias dos jantares realizados aos amigos e sua reputação como um bom cozinheiro. Edouard Vuillard relata uma ocasião em que o artista interrompeu uma de suas festas após o jantar, chamando seus convidados para segui-lo até o apartamento de um amigo, onde uma obra desconhecida de Edgar Degas estava pendurada na parede. Apontando para a pintura, ele disse: “Aí está sua sobremesa!”. Conforme conta outra história do livro, Lautrec preparou seu famoso prato de lagosta na frente de uma plateia na sala de estar de um amigo, ao invés de preparar de na cozinha, o que permite uma associação do ato de cozinhar a uma performance. 

Retrato de Toulouse-Lautrec, de Edouard Vuillard, 1898. Imagem: Museu Toulouse-Lautrec

As receitas do livro são influenciadas pela culinária francesa do séc. XIX, porém algumas são exclusivamente pessoais do artista, como uma receita de canguru assado criada após assistir uma apresentação do animal no circo. O prefácio feito por Alexandra Leaf revela uma proximidade entre arte e comida: “Na cozinha, como em seu ateliê, Henri de Toulouse-Lautrec era um espírito livre. Ignorando o sabor predominante de seu tempo sempre que lhe convinha, o artista saboreava a preparação de pratos inusitados e originais com os quais ele surpreenderia e encantaria seus convidados. Ele acreditava que cozinhar era uma arte como qualquer outra, e os esforços de Lautrec na cozinha eram invariavelmente marcados por sua imaginação fantasiosa”.

Toulouse-Lautrec estava convencido de que a culinária é uma arte, assim como a pintura era para ele, antes de tudo, uma arte de viver. Assim, mesmo depois de se afastar da sociedade e de sua família, o artista não abriu mão de todos os prazeres, e como adorava uma boa comida, criou suas receitas com o mesmo entusiasmo e criatividade que empregava em suas obras.

Entre suas receitas, destaca-se a “Maionese de Chocolate”, que se aproxima do mousse que consumimos hoje em dia.

Receita da Maionese de Chocolate:

4 barras de chocolate

4 colheres de açúcar

½ kg de manteiga

4 ovos

“Em uma panela, coloque quatro barras de chocolate com pouquíssima água e deixe derreter em fogo baixo. Adicione quatro colheres grandes de açúcar, meio quilo de manteiga boa, quatro gemas de ovos e misture cuidadosamente. Deixe esfriar e você terá uma pasta lisa. Bata as claras em neve e misture, mexendo, até obter a maionese de chocolate.”

Imagem: Lara Mazeto

O livro relata que Maurice Joyant foi um amigo muito presente e protetor, criando após a morte do artista o “Museu Toulouse-Lautrec” em Albi, no sul da França, onde estão reunidas a maioria das pinturas que estavam no ateliê do artista. Joyant recolheu as receitas inventadas por Lautrec e as combinou com outras que ele e Lautrec haviam acumulado ao longo de seus anos de amizade e ilustrou com os desenhos do artista. O livro foi publicado em uma edição limitada e foi lançado por Joyant como uma obra de arte e uma homenagem ao artista, tratando a culinária como um verdadeiro “memorial” de sua amizade.

Para conhecer mais sobre o Museu Toulouse-Lautrec, acesse o link: https://musee-toulouse-lautrec.com/

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