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A festa e a missa do vaqueiro de Serrita/PE: É patrimônio imaterial do estado
De acordo com as informações do portal do IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional: A Constituição Federal de 1988, em seus artigos 215 e 216, ampliou a noção de patrimônio cultural ao reconhecer a existência de bens culturais de natureza material e imaterial. Nesses artigos da Constituição, reconhece-se a inclusão, no patrimônio a ser preservado pelo Estado em parceria com a sociedade, dos bens culturais que sejam referências dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira. O patrimônio imaterial é transmitido de geração a geração, constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de sua história, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade humana.
Por tomar dimensões nacionais e proporcionar destaque à cultura do estado, no ano de 2009 a Festa e a Missa do Vaqueiro em Serrita, teve o seu registro como Patrimônio imaterial de Pernambuco. No diário oficial do estado de Pernambuco (ano LXXXVI, Nº 91) é destacado que um dos maiores espetáculos do calendário turístico de Pernambuco, as festividades do vaqueiro, realizada anualmente em Serrita, no Sertão do Estado.
Sobre a importância da referida missa, para as pessoas que a frequentam, bem como para a cultura local; quem nos relata é o senhor Itamar Higino Pereira: “A missa do Vaqueiro em Serrita é uma homenagem grande para todos vaqueiros, não tem outra no mundo não, só não vai quem tiver bem doente, no ano que a gente vai, ver como é o prazer dos maior, é gente de oitenta, noventa anos, arrastando os pés, até para se muntar no cavalo é com a ajuda dos netos, é por isso que tem o maior prazer em ir”.
Através dessas palavras, é perceptível que não há idade específica para frequentar a celebração dos vaqueiros, basta apenas se identificar com o evento e se dirigir ao local. É momento de encontro, comemoração e homenagens. No último final de semana do mês de julho, em Lajes, zona rural de Serrita – PE, reúnem-se um grande número de pessoas para assim, dar continuidade as manifestações culturais nesta região.
Itamar Higino Pereira, 73 anos, agricultor aposentado e vaqueiro, nasceu e reside na fazenda Mameluco. Entrevista cedida a Cícera Luziana de Morais Pinheiro. Em 17 de setembro de 2017.
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Missa, sem vaqueiros
A obra de Luiz Gonzaga do Nascimento, o Rei do Baião, possui um traço importante que é a seara de protesto, ou seja, existem muitas músicas criadas como forma de protestar contra determinadas situações injustas, na visão desse ícone maior da canção nordestina.
Dentre tantas canções há uma de muito significado – A morte do Vaqueiro, que fora construída como protesto e para homenagear o vaqueiro Raimundo Jacó, tido como o mais afamado do sertão nordestino, morto covardemente e por interesses políticos, além de que a justiça do homem deu pro mundo, como bem diz a canção.
Raimundo Jacó tornou-se símbolo dos vaqueiros e, em decorrência dessa canção, Gonzaga e o Padre João Câncio dos Santos, resolveram também criar a Missa do Vaqueiro, celebrada em Serrita, Pernambuco pela primeira vez em 1971.
Celebrada sempre ao terceiro domingo do mês de julho, ao ar livre, num local onde fora construído um altar de pedra rústica em forma de ferradura, a missa do vaqueiro, todos os anos reúne vaqueiros de todos os recantos do Nordeste, que assistem a missa, onde a celebração é conduzida por um padre, com chapéu de coro na cabeça, tendo o canto inicial entoado por um cantor nordestino, com trajes de vaqueiro, destacando em seu canto de aboio a identificação do vaqueiro, a fé e as dificuldades enfrentadas nas ressequidas terras do sertão.
Neste ano de 2023, a missa completou 53 anos de celebração. Contudo, o terceiro domingo de julho deste ano foi de muita tristeza. A missa foi completamente descaracterizada pelo gestor municipal de Serrita – PE, que de forma desconstrutiva agrediu um dos maiores símbolos da cultura gonzagueana, do próprio Estado de Pernambuco e do Brasil – A MISSA DO VAQUEIRO.
Quebrando toda ritualística da Missa, o prefeito integrou ao evento um festival musical que em nada tem ligação com contexto da Missa. Inacreditavelmente, parecem que desejam a todo custo aniquilarem a cultura nordestina. Este ano, a missa, sem vaqueiros foi regada ao som de Gustavo Lima, Xande Avião, Nattan, Tarcísio do Acordeom, Simone Mendes e outras atrações que não possuem conexão alguma com esse evento.
Mas, o que significa Missa do Vaqueiro? A Missa do Vaqueiro é um evento religioso, tradicional na cultura popular do sertão pernambucano, então, indago, qual o motivo de se agredir tão violentamente essa cultura.
Há tempos que existe um articulo movimento para a desconstrução da nossa cultura e, não podemos assistir tudo isso calados. É preciso reagir. Não se pode permitir que esse evento possa ser transformado numa missa, sem vaqueiros e sem a essência para a qual fora idealizada, criada e que já se perpetua por 53 anos.
Quer fazer um festival musical, seu prefeito? Faça, mas de outra forma, sem aniquilar a cultura de um povo chamado Nordeste. É preciso respeito. É preciso que as autoridades competentes tenham responsabilidades e que o Estado de Peranambuco, por seu Ministério Público, possa adotar medidas que visem freiar essa conduta destrutiva.
Esperamos que em 2024, a Missa volte a ter o seu formato original, até porque, missa não combina com esse tipo música, que muitas vezes troca o “P” da poesia pelo “p” da pornografia.
Como escritor e amante da cultura nordestina não podia, nem posso ficar silente diante de tão grave situação.
Viva Luiz Gonzaga, Viva Padre João Câncio, Viva a Missa do Vaqueiro!
● ONALDO QUEIROGA
Escritor,Poeta e Juiz de Direito.